Que o catálogo de filmes retratando a Segunda Guerra Mundial e a Alemanha nazista está lotado de exemplos, é impossível negar. Todavia, pouquíssimos – isso só para não dizer que nenhum – longas metragens exibem a história da guerra da forma que Jojo Rabbit apresenta. Não apenas pelo olhar de um alemão nazista, como também, de uma criança que tem o Führer como melhor amigo.
A priori, o ponto de vista da narração da estória, adaptada do livro Caging Skies, da romancista neozelandesa Christine Leunens, parece um caminho perigoso para a produção de um filme, visto que – com razão – retratar o antissemitismo pelo olhar do opressor é como pisar em ovos. Jojo Rabbit, entretanto, atinge seu objetivo, deixando clara a sátira ao pensamento nazista e modificando um pouco o ditado popular para algo como: “seria triste, se não fosse cômico”.
Dirigido por Taika Waititi, o mesmo diretor de Thor: Ragnarok (2017), o filme concorreu em seis categorias do Oscar, das quais ganhou como “melhor roteiro adaptado”. Além da direção, coube a Waititi o papel de Hitler, visto que ninguém mais aceitou representá-lo. A informação foi divulgada pelo próprio diretor, em entrevista à USA Today:
Nós fomos atrás de vários atores para o papel de Hitler, mas todos os agentes estavam com muito medo de pedir para eles, então a Fox Searchlight me encorajou a fazer o papel.
Sempre acompanhado por um Hitler “fofo e bondoso”, que deseja apenas salvar o mundo dos abomináveis – e dignos de filmes de ficção científica, eu diria – judeus, o garoto parece projetar a própria bondade no ditador, que também conta com uma propaganda digna de um verdadeiro herói.
A certeza de que segue o caminho do bem se mantém intacta, até que Jojo finalmente descobre que Elsa (Thomasin McKenzie), uma garota judia, está escondida em sua casa. A mãe, que para o menino também compartilhava a filosofia de Hitler, também passa por algumas situações que não posso dizer aqui (cuidado com os pés, só posso dizer isso), enquanto o filme, que começa como um humor exagerado, começa a revelar o drama vivido por alemães e judeus até não parecer possível termos rido nos primeiros 30 minutos da longa.
Ainda como um amigo imaginário, é interessante observar as mudanças de Hitler ao longo da produção, a crueldade que começa a surgir no ditador enquanto a ideia dos judeus como monstros comedores de criancinhas parece fazer cada vez menos sentido da cabeça do garoto.
Apesar de retratar o antissemitismo de uma forma que não é agradável a todos os públicos – como a própria Rotten Tomatoes elucida -, o que explica as críticas negativas que o filme sofreu por várias pessoas. Jojo Rabbit consegue fazer com que o público reflita, tanto com as sátiras escancaradas, quanto com o drama que carrega. Sempre lotado de eufemismos, visto que tudo acontece sob os olhos de uma criança de 10 anos.
Parecido com Parasite (2019), que venceu Jojo Rabbit como melhor filme – e foi o mais premiado da noite, junto à produção que também envolve guerras, 1917 (2019) -, o filme possui uma transição de clima tão gradual que é quase impossível de perceber em que momento as risadas deram lugar às lágrimas, o que, sem dúvidas, torna a experiência mais interessante. Ainda semelhante a Parasite, o filme realiza debates importantes – como o machismo e o antissemitismo – sem precisar de diálogos extensos.
Terminando junto ao final da guerra, este drama-comédia nos deixa a possibilidade de refletir e debater as temáticas apresentadas: num mundo com Trumps, Bolsonaros e tantas referências nazistas, Jojo Rabbit explica que até uma criança é capaz de perceber os males que a intolerância é capaz de causar.
Ri MUITO desse filme. Aquele humor negro que vale a pena. Se não fosse considerado cult e fosse da Netflix, teria sido processado rsrs